O
Companheirismo é uma das sete virtudes cardeais de um DeMolay, representada
simbolicamente pela quarta vela, ao centro das demais. No dizeres do nosso
ritual, “ser amigo certo e fiel é demonstrar uma verdadeira virtude, que adorna
nossa natureza humana. [...] Nenhum homem, jovem ou velho, pode ter mais honra
do que se considerar realmente amigo de alguém e ser digno da confiança total
dessa pessoa.”
Por
diversos motivos considero o Companheirismo, sem desmerecer as demais, por
óbvio, a virtude mais essencial à Ordem DeMolay e ao caráter humano. Haja vista
que o verdadeiro companheirismo, destrinchada até seu âmago, reluzente em sua
amplitude já, por si só, engloba outras virtudes. Um companheirismo nato já
pressupõe a fidelidade, a cortesia, até mesmo a pureza e o patriotismo. Porque
amar incondicionalmente ao outro demanda lhe ser fiel, cortês, inclusive ser
despido de ganância e malícia, além de venerar sua pátria onde convive com seus
companheiros.
Nossa
quarta vela até alvo de mitos já foi, e isso reflete talvez esse sentimento
especial por essa virtude, como a famosa história da linha imaginária ou campo
de energia que liga justamente a vela do Companheirismo ao Mestre Conselheiro.
Contudo,
sendo ou não a mais essencial dentre as nossas virtudes, verdade é que ela é a
responsável por nos unir, por nos tornar um grande organismo em prol de um bem
maior. É devido a ela que nós formamos uma grande fraternidade, nos tornando verdadeiros
irmãos. Nosso ícone máximo, Jacques DeMolay, o qual reverenciamos levando seu
sobrenome como título de nossa Ordem, se tornou nosso herói mártir justamente
por colocar a virtude do companheirismo em um grau jamais visto, preferindo
morrer a trair seus companheiros ou faltar com seu juramento.
Portanto,
se em face das injustiças e dificuldades não permanecermos firmes em defesa desta
virtude, estaremos renegando nossa Fraternidade e denunciando nossa condição
humana para tornarmos animais primitivos.
Todavia,
o Companheirismo, por ser uma virtude tão plena, não precisa de exemplos
trágicos para se manifestar. Na verdade, ela é reluzente, principalmente, nas
sutilezas e nos detalhes, invisíveis aos olhos despercebidos, mas flamejantes a
quem sabe valorizar as coisas certas.
Por
isso que trago o Congresso Estadual da Ordem DeMolay como cenário repleto de
demonstrações, algumas até engraçadas, da magnífica virtude do companheirismo.
Passar
três dias e duas noites com os irmãos de todo o Estado em um alojamento já é
por si só uma demonstração de companheirismo. A bagunça no ônibus, a bagunça
nos dormitórios, a bagunça no banheiro, a bagunça no refeitório... já refletem
a intimidade e a fraternidade resultadas desse companheirismo. Portanto, por
mais que a bagunça seja, a priori,
algo negativo, obrigo-me a discordar. Quando ela é tratada, evidentemente, de
maneira responsável, ela só tende a aproximar os irmãos, quebrar a timidez,
solidificar o convívio e, principalmente, estabelecer os laços de confiança.
Isto é, o Companheirismo simbolizado numa chama transcende para a realidade
factual, transformando-a numa amizade plena.
Por
conseguinte, algumas situações engraçadas acabam resultando desse processo e o
cenário perfeito para isso é o banheiro do alojamento do congresso. Isto porque
o alojamento é uma escola pública, onde as salas tornam-se os dormitórios. Por
isso que na hora do banho estamos também testando nosso companheirismo, em
especial porque geralmente os banheiros não têm divisórias. Ou seja, todos nós
tivemos que perder a timidez para tomar banho, preferencialmente de cueca, ou
da forma como viemos ao mundo, para aqueles mais aventurados, e na frente de
qualquer outro irmão que adentrasse ao recinto. A primeira vez é sempre mais
constrangedora, mas sempre o clima de descontração nos faz rapidamente perder a
vergonha e tomar banho, mesmo que de cueca, na frente de qualquer outro irmão.
Outra
situação especial trata-se do exercício de uma necessidade básica pela qual
passamos todos os dias: o conhecido número dois. Pois é, digamos que um
banheiro por onde passam uns trezentos jovens não seja o lugar mais desejado e
confortável para tal prática. Porém nosso alojamento localizava-se em frente ao
Hiper Bompreço de Mossoró e foi incrível como vários irmãos tiveram a mesma
ideia de dirigir-se a tal supermercado para, digamos, desafogar. A frase “vou
ao Hiper” tornou-se sinônimo de ir ao banheiro.
O
mais interessante ainda é que nós combinávamos com os outros para “irmos ao
Hiper”. Enquanto em situações normais cada um vai ao banheiro naturalmente e
sem nem dizer a outrem, quando íamos ao Hiper chamávamos alguns irmãos para
irmos juntos. Deparei-me com a situação de juntar quatro irmãos especialmente
para o desempenho de tal designo. Foi relatado no último dia, pasmem, que o
referido supermercado chegou a fechar o banheiro masculino.
Sem
falar na cara de felicidade daqueles que saiam do Hiper depois de tentar adiar
ao máximo tal encargo; a frase que se via em suas feições, era que “a vida faz
sentido”.
Por
mais estranho que possa parecer, essas experiências são sim exemplos de
companheirismo, exemplos de como esta virtude é ampla e pode alcançar facetas e
ângulos inimagináveis.
O brilhantismo está nas coisas
simples, em que pesem, por óbvio, os exemplos gloriosos como o de Jacques DeMolay.
Mas como muito provavelmente não precisaremos passar por situações análogas a
que ele passou, o verdadeiro companheirismo refletido numa amizade pura,
fazendo com que criemos uma reluzente irmandade, será muito maior quando nos
tratarmos acima de tudo com espontaneidade e amor, e isto não se cria apenas
com um juramento, mas com o próprio convívio, com proximidade, com situações
engraçadas e tristes, mas de forma natural e com paixão.
Tive, inclusive, a honra de
testemunhar de um irmão pelo qual tenho profunda consideração e admiração um
relato incrivelmente sincero e lúcido, que indubitavelmente traduz um sentimento
comum a todo DeMolay. “Foi depois deste congresso que eu me senti realmente
como um DeMolay”. E eu não tenho dúvida que esta realização se deu, de forma essencial,
em razão da manifestação da virtude do Companheiro através dessa forma
acolhedora e pela energia fraternal existente em nossa Ordem, nos tornando
capazes de confiar plenamente nuns aos outros.
Portanto, “a Coroa da Juventude
não estaria completa sem a jóia que representa esta esplêndida virtude”.
Abraços fraternos, Gabriel Villarim
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