terça-feira, 24 de abril de 2012

Companheirismo à luz de um Congresso



            O Companheirismo é uma das sete virtudes cardeais de um DeMolay, representada simbolicamente pela quarta vela, ao centro das demais. No dizeres do nosso ritual, “ser amigo certo e fiel é demonstrar uma verdadeira virtude, que adorna nossa natureza humana. [...] Nenhum homem, jovem ou velho, pode ter mais honra do que se considerar realmente amigo de alguém e ser digno da confiança total dessa pessoa.”
            Por diversos motivos considero o Companheirismo, sem desmerecer as demais, por óbvio, a virtude mais essencial à Ordem DeMolay e ao caráter humano. Haja vista que o verdadeiro companheirismo, destrinchada até seu âmago, reluzente em sua amplitude já, por si só, engloba outras virtudes. Um companheirismo nato já pressupõe a fidelidade, a cortesia, até mesmo a pureza e o patriotismo. Porque amar incondicionalmente ao outro demanda lhe ser fiel, cortês, inclusive ser despido de ganância e malícia, além de venerar sua pátria onde convive com seus companheiros.
            Nossa quarta vela até alvo de mitos já foi, e isso reflete talvez esse sentimento especial por essa virtude, como a famosa história da linha imaginária ou campo de energia que liga justamente a vela do Companheirismo ao Mestre Conselheiro.
            Contudo, sendo ou não a mais essencial dentre as nossas virtudes, verdade é que ela é a responsável por nos unir, por nos tornar um grande organismo em prol de um bem maior. É devido a ela que nós formamos uma grande fraternidade, nos tornando verdadeiros irmãos. Nosso ícone máximo, Jacques DeMolay, o qual reverenciamos levando seu sobrenome como título de nossa Ordem, se tornou nosso herói mártir justamente por colocar a virtude do companheirismo em um grau jamais visto, preferindo morrer a trair seus companheiros ou faltar com seu juramento.
            Portanto, se em face das injustiças e dificuldades não permanecermos firmes em defesa desta virtude, estaremos renegando nossa Fraternidade e denunciando nossa condição humana para tornarmos animais primitivos.
            Todavia, o Companheirismo, por ser uma virtude tão plena, não precisa de exemplos trágicos para se manifestar. Na verdade, ela é reluzente, principalmente, nas sutilezas e nos detalhes, invisíveis aos olhos despercebidos, mas flamejantes a quem sabe valorizar as coisas certas.
            Por isso que trago o Congresso Estadual da Ordem DeMolay como cenário repleto de demonstrações, algumas até engraçadas, da magnífica virtude do companheirismo.
            Passar três dias e duas noites com os irmãos de todo o Estado em um alojamento já é por si só uma demonstração de companheirismo. A bagunça no ônibus, a bagunça nos dormitórios, a bagunça no banheiro, a bagunça no refeitório... já refletem a intimidade e a fraternidade resultadas desse companheirismo. Portanto, por mais que a bagunça seja, a priori, algo negativo, obrigo-me a discordar. Quando ela é tratada, evidentemente, de maneira responsável, ela só tende a aproximar os irmãos, quebrar a timidez, solidificar o convívio e, principalmente, estabelecer os laços de confiança. Isto é, o Companheirismo simbolizado numa chama transcende para a realidade factual, transformando-a numa amizade plena.
            Por conseguinte, algumas situações engraçadas acabam resultando desse processo e o cenário perfeito para isso é o banheiro do alojamento do congresso. Isto porque o alojamento é uma escola pública, onde as salas tornam-se os dormitórios. Por isso que na hora do banho estamos também testando nosso companheirismo, em especial porque geralmente os banheiros não têm divisórias. Ou seja, todos nós tivemos que perder a timidez para tomar banho, preferencialmente de cueca, ou da forma como viemos ao mundo, para aqueles mais aventurados, e na frente de qualquer outro irmão que adentrasse ao recinto. A primeira vez é sempre mais constrangedora, mas sempre o clima de descontração nos faz rapidamente perder a vergonha e tomar banho, mesmo que de cueca, na frente de qualquer outro irmão.
            Outra situação especial trata-se do exercício de uma necessidade básica pela qual passamos todos os dias: o conhecido número dois. Pois é, digamos que um banheiro por onde passam uns trezentos jovens não seja o lugar mais desejado e confortável para tal prática. Porém nosso alojamento localizava-se em frente ao Hiper Bompreço de Mossoró e foi incrível como vários irmãos tiveram a mesma ideia de dirigir-se a tal supermercado para, digamos, desafogar. A frase “vou ao Hiper” tornou-se sinônimo de ir ao banheiro.
            O mais interessante ainda é que nós combinávamos com os outros para “irmos ao Hiper”. Enquanto em situações normais cada um vai ao banheiro naturalmente e sem nem dizer a outrem, quando íamos ao Hiper chamávamos alguns irmãos para irmos juntos. Deparei-me com a situação de juntar quatro irmãos especialmente para o desempenho de tal designo. Foi relatado no último dia, pasmem, que o referido supermercado chegou a fechar o banheiro masculino.
            Sem falar na cara de felicidade daqueles que saiam do Hiper depois de tentar adiar ao máximo tal encargo; a frase que se via em suas feições, era que “a vida faz sentido”.
            Por mais estranho que possa parecer, essas experiências são sim exemplos de companheirismo, exemplos de como esta virtude é ampla e pode alcançar facetas e ângulos inimagináveis.
O brilhantismo está nas coisas simples, em que pesem, por óbvio, os exemplos gloriosos como o de Jacques DeMolay. Mas como muito provavelmente não precisaremos passar por situações análogas a que ele passou, o verdadeiro companheirismo refletido numa amizade pura, fazendo com que criemos uma reluzente irmandade, será muito maior quando nos tratarmos acima de tudo com espontaneidade e amor, e isto não se cria apenas com um juramento, mas com o próprio convívio, com proximidade, com situações engraçadas e tristes, mas de forma natural e com paixão.
Tive, inclusive, a honra de testemunhar de um irmão pelo qual tenho profunda consideração e admiração um relato incrivelmente sincero e lúcido, que indubitavelmente traduz um sentimento comum a todo DeMolay. “Foi depois deste congresso que eu me senti realmente como um DeMolay”. E eu não tenho dúvida que esta realização se deu, de forma essencial, em razão da manifestação da virtude do Companheiro através dessa forma acolhedora e pela energia fraternal existente em nossa Ordem, nos tornando capazes de confiar plenamente nuns aos outros.
Portanto, “a Coroa da Juventude não estaria completa sem a jóia que representa esta esplêndida virtude”.

Abraços fraternos, Gabriel Villarim

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